sábado, 11 de abril de 2009

Caminhada Fúnebre


Era apenas mais um garoto normal como todos os outros. Cabelos negros, pernas finas, olhos profundos e corpo magricela, nada de exuberante nem de anormal. Seu olhar era esperto e ligeiro, como o de alguém que espera ansiosamente por algo que sabe que está para acontecer, enquanto seu sorriso amarelo e escancarado transpassava a inocencia de não saber o motivo de sorrir.

A praça era sua companheira, estava vinculada a seu corpo e alma como tatuagens feitas a ferro pela mão do destino. Cada rosa ou girassol florescia ao mais leve suspiro do saltitante e sorridente menino comum. Ele não podia fugir dela, cada caminho, cada árvore, cada escuridão levava para a mesma clareira no centro da praça cheia de flores.

Até o dia em que uma parede de arbustos foi cortada e um caminho diferente de todos os outros que ele já vira se formou a sua frente. Curioso, deixou suas brincadeiras e certezas para trás e correu pelo caminho recém formado atrás de respostas para suas dúvidas. Era um trajeto obscuro, cheio de árvores rançosas e caules com espinhos que o machucavam e o faziam sangrar insegurança e medo daquilo que estava a sua frente que ele desconhecia.

No fim encontrou algo novo e que sempre suspeitara encontrar. Estava parado no fim do caminho de arbustos e em frente a uma enorme e larga rua onde tudo o que tinha ao seu redor eram torres cinzas e doloridas tentando esconder do sol os carros apressados que diariamente passavam a sua face.

Aquilo o assustou e o fez ter vontade de recuar de volta para seu lugar aconchegante e seguro de antes, mas não podia, o caminho a suas costas havia se fechado e imposto uma única condição, ficar e definhar com a frustração temporária cotidiana ou atravessar a rua e se aventurar em um mundo onde ele jamais esteve, onde tudo o que ele tinha certeza era apenas aquilo que ele não tinha certeza.

Ele fez sua opção e colocou o primeiro pé no asfalto quente e acinzentado, que um dia fora negro como o destino de quem o fez. Não olhou para os lados, não sabia o que deveria realmente fazer. Seguir, parar, voltar? Qual seria o caminho certo agora? Onde estava a clareira? Onde se encontrava o caminho obscuro feito de arbustos por onde passou tempos atrás?

Ele queria a certeza, mas não a encontrava. Não podia voltar para trás, os carros estavam passando violentamente rápidos a suas costas agora e podia ser atropelado, a única chance de sobrevivencia era prosseguir. Buracos, acidentes, carros, tudo era o que seus olhos estavam acostumados a enchergar. Onde estavam as flores? Cadê o leve aroma dos lírios brancos e puros? Onde se encontrava a ansiosidade de prosseguir sem saber do que o esperava? Ele então se perguntou ao fim, qual era o real sentido de se atravessar aquela rua tão movimentada?

Fechado em seus pensamentos, olhando para pé ante pé que o levava em direção ao nada ou a tudo, levou um golpe que não esperava receber de um moderno e belíssimo carro negro sem motorista nem direção, mas que tinha a missão de jogá-lo para o outro lado da rua, onde a calçada dizia fim.

Desmaiado em carmim, observando a luz do infinito a sua frente, teve tempo ainda de olhar para trás e observar seu caminho. Suas mãos estavam secas e frias, seus olhos estavam perdidos no assovio mudo do vento. O cabelo não era mais negro mas sim a mistura da neve gélida do inverno com a nuvem úmida da chuva. Ele não enxergava mais a rua, havia acabado de sair dela, mas podia se enxergar saindo da clareira radiante e indo em direção ao caminho obscuro. Queria ele avisar o quanto sofreria, o quanto veria e o quanto iria julgar, mas não podia, era tarde, o carro negro já o iria buscar, o carmim já seria limpado da calçada e a única coisa que ele podia pensar em fazer era olhar para trás e perceber que o verdadeiro sentido da travessia da rua era poder olhar para a praça e dizer, um dia fui feliz.

Douglas Ibanez